Entenda a extensão da proteção do bem de família, ou seja, os bens que são considerados como impenhoráveis.
Direito à moradia e proteção à família
A Constituição Federal de 1988 consagrou a proteção tanto à moradia, quanto à família, buscando garantir a subsistência mínima aos cidadãos. Vejamos a proteção ao direito de moradia estampado no rol dos direitos sociais:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
No mesmo sentido, a proteção da família como base da sociedade civil:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
Proteção ao imóvel de moradia
Visando regulamentar esse direito, a Lei 8.009/90 dispôs especificamente sobre a impenhorabilidade do bem de família, de forma a proteger de eventual execução os imóveis que servem de moradia para o indivíduo e sua família. Vejamos:
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
Nota-se, portanto, que o imóvel da entidade familiar não responderá por dívidas de seus proprietários, caso nele residam.
Importante observar que a lei supramencionada protege até os artigos que guarnecem a casa, desde que estejam quitados. No mesmo sentido, o CPC prevê no artigo 833 que são impenhoráveis os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida.
E o que poderiam ser considerados como esses objetos que não recebem a proteção da impenhorabilidade? Obras de arte, objetos de recreação, tudo que não seja necessário para um padrão de vida comum.
Você pode estar se perguntando: mas e a pessoa solteira, que não tem família, mas que tem um único imóvel que utiliza como moradia?
Apesar de a Lei 8.009/90 não dizer nada a respeito, foi fixado entendimento no STJ de que a proteção da impenhorabilidade também abarca esses casos. Nesse sentido é a Súmula 364 do STJ:
Súmula 364: O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
De igual forma, a penhora não pode recair sobre o único imóvel do devedor, mesmo que ele não o utilize como moradia, mas alugue-o e utilize a quantia com o seu aluguel para a sua subsistência. Esse é o entendimento também sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 486. É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.
Algumas exceções à impenhorabilidade do bem de família
Toda regra comporta exceções e, no caso da impenhorabilidade do bem de família não é diferente. Dentro da prórpia lei estão previstas as exceções, através dos incisos do artigo 3º:
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;
III – pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida;
IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Nesse mesmo sentido, prevê o CPC:
Art. 833. São impenhoráveis:
(…)
§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à execução de dívida relativa ao próprio bem, inclusive àquela contraída para sua aquisição.
A partir da leitura dos dispositivos acima nota-se que toda vez que o proprietário for cobrado por dívidas oriundas do próprio bem, como por exemplo IPTU, o imóvel pode sim ser penhorado, não se submetendo à regra da impenhorabilidade.
Multiplicidade de imóveis residenciais
Na situação de o devedor ter mais de um imóvel em que permanece de maneira habitual, ou seja, ter mais de uma residência, o artigo 5º da Lei 8.009/90 prevê que a proteção da impenhorabilidade somente abrangerá o imóvel de menor valor.
Estamos falando do caso em que o devedor tem mais de um imóvel como residência, não no caso em que simplesmente possui mais de um imóvel. Nessa segunda hipótese, em que o devedor tem vários imóveis e um deles servir-lhe de moradia, a proteção incidirá somente sobre esse último, independente de ser o imóvel mais caro.
Dessa forma, a Lei 8.009/90 veio para resguardar um direito constitucionalmente assegurado de forma a proteger a família e o direito a moradia prevendo a impenhorabilidade da residência familiar. Ainda assim é preciso considerar que a regra comporta várias exceções em que a impenhorabilidade não será considerada, a depender da natureza da dívida.
Conclusão
Então, recapitulando: os bens de família são impenhoráveis e, como tais, são considerados aqueles destinados à moradia (até mesmo se ocupado por uma única pessoa). A impenhorabilidade impede que respondam por dívidas contraídas pelas pessoas que a partir deles garantem seu direito à moradia. Mas, conforme explicitado, existem exceções, como por exemplo o caso em que a dívida é do próprio imóvel.
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