Entenda porque se torna cada vez mais comum a prática de doar imóveis em vida e como fazer.
A cada dia torna-se mais comum o chamado planejamento sucessório, que ocorre quando o titular de direitos patrimoniais (dono de imóveis, empresas etc.) resolve a destinação do seu patrimônio enquanto ainda está vivo.
No ano de 2016, o assunto passou a ter mais enfoque no Brasil quando descobriram que o filho de 7 anos do então presidente da república Michel Temer era proprietário de imóveis que somavam a monta de mais de 2 milhões de reais.
O planejamento sucessório normalmente se refere à totalidade dos bens de uma pessoa, contudo hoje falaremos mais especificamente sobre os bens imóveis. Afinal, qual o benefício de doar bens imóveis em vida?
Motivos que levam o proprietário a fazer doações em vida
Entre as principais motivações para que pessoas realizem a destinação dos seus bens em vida é a de poupar os herdeiros do desgastante processo de inventário que, além de custoso e por vezes demorado, não raro gera conflitos entre os sucessores do autor da herança. É possível também, através da doação em vida, que o dono dos imóveis disponha dos mesmos com mais liberdade de acordo com seu desejo desde que observe a legítima, correspondente a 50% (cinquenta por cento) do patrimônio que deve ser reservado para os herdeiros necessários. Vejamos o que nos diz o Código Civil sobre esse tema:
Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.
Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima.
Art. 1.847. Calcula-se a legítima sobre o valor dos bens existentes na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas do funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos a colação.
Os bens sujeitos à colação mencionada no artigo acima são justamente aqueles que foram doados pelo falecido aos herdeiros como forma de antecipação de herança.
Nesse sentido é necessário que, caso a pessoa interessada no planejamento sucessório queira fazer uma doação desigual entre os herdeiros, privilegiando alguns em detrimento de outros ou adequando outros tipos de preferência em vida percebidos pelo autor da herança, deve ficar expresso no ato de doação que não se trata de antecipação de herança, ou seja o valor sairá da parte da herança que a pessoa tem interesse de dispor livremente (50% do patrimônio). Isso porque no capítulo em que trata do contrato de doação o Código Civil prevê:
Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança.
Sendo assim, essa será a regra geral e caso não seja do interesse do doador que configure o adiantamento deve expressar de forma clara. Inclusive, esse é um dos interesses que podem ser levados em conta na hora do planejamento sucessório: o desejo de privilegiar um herdeiro por qualquer motivo que seja. Se assim for de vontade da pessoa é muito importante a utilização deste instrumento uma vez que, nada sendo feito, a divisão da herança se dará nos moldes ditados pela lei.
Procedimento de doação de imóveis em vida
Para fazer a doação dos imóveis em vida é necessário que se respeite o procedimento previsto em lei e aqui vale a mesma regra da compra e venda: para imóveis cujo valor ultrapassam a soma de 30 salários-mínimos é imprescindível que a doação seja realizada por escritura pública.
A doação nada mais é que um contrato em que de um lado temos o doador, na figura daquele que deseja transferir os bens, e do outro o donatário, aquele que recebe os bens de forma não onerosa, ou seja gratuita.
Apesar de o Código Civil prever em seu artigo 541 que a doação pode ser feita mediante escritura pública ou instrumento particular, o artigo 108 do mesmo diploma prevê regramento específico para bens imóveis, estabelecendo que a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente.
Dessa forma, a doação de imóveis que superem o valor de R$33.000 (trinta e três mil reais) no ano de 2021 deve obrigatoriamente respeitar a forma prevista em lei e ser realizada por meio de escritura pública lavrada no tabelionato de notas.
Antes de ser lavrada a escritura pública de doação, deverá ser apurado e pago o imposto incidente sobre a operação que neste caso é o ITCMD – Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, de competência estadual.
O procedimento é realizado de acordo com o previsto pela autoridade fazendária de cada Estado, mas todos se baseiam na declaração preenchida pelo doador, podendo os imóveis serem ou não reavaliados pelo fisco. Aqui é muito importante observar que estar assistido por um profissional competente fará toda a diferença, uma vez que cabe recurso da avaliação realizada pelo fisco que pode impactar e muito no valor do imposto a ser quitado ao final do procedimento, como muitos casos já vivenciados por nós no escritório.
Apurado o imposto e quitado o valor, é possível que se agende para a lavratura da escritura pública de doação do imóvel em questão no cartório de notas. Importante destacar que o cartório pode ser o de escolha do doador e não necessariamente estar na cidade em que o imóvel doado se encontra. Os emolumentos irão variar de acordo com o Estado escolhido, podendo haver diferenças sutis entre cartórios inseridos no mesmo Estado a depender do valor dos serviços cobrado pelo cartório, sendo certo que os emolumentos, taxas de fiscalização são tabelados pelo Tribunal de Justiça de cada Estado.
Ao final desse procedimento de escritura pública é necessário que a mesma seja devidamente levada a registro no Cartório de Registro de Imóveis competente, ou seja aquele em que a matrícula do imóvel está registrado. Esse registro sim necessita ser feito na cidade em que o imóvel se encontra.
Importante destacar que este ato final esquecido por muitos é essencial para a efetiva transferência do imóvel nos moldes do previsto pelo Código Civil:
Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.
Quanto vou gastar para fazer o procedimento?
Além dos honorários do profissional que te acompanhará no processo de planejamento sucessório, que no geral são menores do que o valor cobrado no inventário, existem os gastos com tributos e emolumentos cartorários. Para clarear o tema, vamos a um exemplo prático levando em consideração o Estado de Minas Gerais.
Aqui em Minas, o imposto incidente sobre doações é regido pela Lei Estadual nº 14.941/2003, e regulamentado pelo Decreto Estadual nº 43.981/05 (RITCD). Atualmente, a alíquota no estado é de 5% (cinco por cento) incidente sobre o valor de mercado dos bens ou direitos transmitidos a título gratuito.
Contudo existe um desconto para doações de até 90.000 (noventa mil) UFEMG (unidade fiscal do estado de Minas Gerais). O valor de cada unidade fiscal é atualizada a cada ano de acordo com resolução da Secretaria de Estado da Fazenda de Minas Gerais e em 2021 1 UFEMG corresponde a R$ 3,9440 (três reais, nove mil quatrocentos e quarenta décimos de milésimos).
Isso significa que, para valores de doação até R$354.960, 00 (trezentos e cinquenta e quatro mil novecentos e sessenta reais) o imposto de doação cai de 5% para 2,5%. Uma boa economia, não é mesmo?
Importante destacar que aqui falamos do valor de doação, não do valor do imóvel, já que existe a hipótese de o proprietário estar doando para mais de um herdeiro.
Considerando um imóvel a ser doado no valor de R$500.000,00 (quinhentos mil) na proporção de 50% para cada donatário, o desconto se aplicaria e teríamos o valor de imposto de R$12.500, 00 (doze mil e quinhentos).
Passado esse momento, continuando com a exemplificação de gastos, teríamos que o valor da escritura pública de doação de R$3.762,30 (três mil setecentos e sessenta e dois reais e trinta centavos) de acordo com a tabela de emolumentos do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e mais R$ 3.762,30 (três mil setecentos e sessenta e dois reais e trinta centavos) para registro do ato no cartório de registro de imóveis.
O valor total com tributos e cartório seria em torno de R$20.024, 60 (vinte mil e vinte e quatro reais e sessenta centavos). Se fosse o caso de inventário esse valor subiria para R$32.524,60 (trinta e dois mil quinhentos e vinte e quatro reais e sessenta centavos). Veja que diferença! E isso levando-se em conta o mesmo valor para fins de base de cálculo. Mas pode ocorrer de hoje o imóvel ter um valor inferior ao momento em que for transferido em caso de inventário, o que decorre da esperada valorização imobiliária.
Quais as vantagens de doar bens em vida
Muitos procuram doar imóveis e outros bens em vida como forma de não onerar os herdeiros em um momento difícil como a morte evitando também brigas e disputas por patrimônio, contudo essa é apenas uma das vantagens do planejamento sucessório como demonstrado acima.
Vamos enumerar aqui algumas vantagens deste tipo de procedimento que pode ser feito de diversas formas (formação de holding patrimonial, doação em vida, mescla das duas, entre outras), a ser analisada pelo profissional contrato a mais vantajosa para o cliente.
Outras vantagens do planejamento sucessório:
- Evita a dilapidação do patrimônio através de um inventário que pode ser moroso e litigioso;
- Possibilidade de vantagens tributárias;
- Evita o pagamento de impostos de uma só vez, podendo ser feito aos poucos;
- Honorários incidentes podem ser menores que no processo de inventário;
- Liberdade do dono do patrimônio para dispor de acordo com seu desejo;
Enfim, muitas são as vantagens deste tipo de planejamento, não somente para bens imóveis, mas para todo o patrimônio. Esperamos que a leitura tenha sido elucidativa e, caso precise de mais informações ou esteja interessado em realizar o seu planejamento patrimonial, entre em contato com a autora do artigo.
Artigos relacionados:
Planejamento sucessório: uma boa opção para você!
Quem vai assumir minha empresa depois de mim?