IMOBILIÁRIO, PARA ADVOGADOS

O que advogados precisam saber sobre a Lei do Inquilinato

Para muitos de nós, ter um lugar para morar significa alugar um imóvel. A lei do inquilinato regulamenta essa relação entre aquele que coloca o imóvel à disposição para que outra pessoa possa utilizá-lo por determinado tempo, mediante contraprestação financeira. Esses papéis são, respectivamente, de locador e locatário. 

Este texto pretende apresentar um panorama geral sobre a lei, destacando os pontos que chamam mais a atenção, além de pontuar os principais direitos e obrigações de ambas as partes que transigem nesses contratos de locação de imóvel urbano.

O que é a lei do inquilinato?

A Lei do Inquilinato é um apelido não formal que foi atribuído à Lei Federal n. 8.245, de 1991, que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos e os procedimentos a ela pertinentes. Uma curiosidade é que, na verdade, a lei não usa o termo “inquilino” em nenhum momento, referindo-o apenas como locatário, palavra sinônima.

No início da década de 90’, com a parca disponibilidade de imóveis e a precária regulamentação sobre o tema, propôs-se o Estado a criar maior previsibilidade e segurança jurídica para essas relações. A partir dessa lei foram estipuladas condições gerais para locações urbanas, sejam elas residenciais ou não.

Antes de seu surgimento, o principal diploma sobre o tema era o Código Civil de 1916, além de leis esparsas, cujo somatório se mostrava insuficiente para gerar proteção e regulação para o mercado de locações imobiliárias. Isso porque os contratos podiam ser feitos sem as atuais balizas e limitações, o que acabou promovendo recorrentes abusos, principalmente por parte dos locadores. 

Destaques da lei do inquilinato

Agora apresentaremos alguns pontos de destaque da lei do inquilinato e a justificativa para o respectivo apontamento, considerando-se sobretudo as circunstâncias práticas com as quais convivemos. 

  • Em regra, durante o prazo estipulado para o contrato, não poderá o locador reaver o imóvel (art.4º) – atenção para o artigo 9º. 

Por sua vez, o locatário pode devolver, mediante o pagamento de uma multa (idem). 

  • A ação para o locador rever o imóvel é a ação de despejo (art.5º).

A lei prevê quatro tipos de procedimentos judiciais, sendo a ação de despejo um deles (arts.59 a 75). 

  • Nos contratos que vigem por prazo indeterminado, o locatário pode denunciar o contrato e sair após 30 dias (art.6º). 

Essa prerrogativa também se aplica ao locador, no caso dos contratos com duração superior a 30 meses (art.46, §2º).

  • A locação pode ser desfeita por mútuo acordo entre as partes, infração legal ou contratual (inclusive falta de pagamento) e reparações urgentes determinadas pelo Poder Público (art.9º). 

Essa prerrogativa também se aplica ao locador, no caso dos contratos com duração superior a 30 meses (art.46, §2º). 

  • A locação pode ser desfeita por mútuo acordo entre as partes, infração legal ou contratual (inclusive falta de pagamento) e reparações urgentes determinadas pelo Poder Público (art.9º). 

Esse artigo é muito importante, referido em outros artigos da lei, que repetem essas hipóteses de resolução contratual (tais como: arts.47 e 53).

  • O pagamento do aluguel não pode ser cobrado de forma antecipada, em regra (art.20). Tal prática chega a ser considerada como contravenção penal! (art.43, II). 

As exceções são: i) quando não for estipulada nenhuma garantia (art.42); ii) nas locações para temporada (art.50).

  • Não se pode exigir mais de uma garantia (art.37, §ú). 

A lei prevê, além da nulidade, que tal prática configura-se como contravenção penal (sujeita a prisão ou multa – art.43,II).

  • Considera-se crime retomar o imóvel forjando-se uma das hipóteses desta lei (art.44, II e III). 

Como solicitar para uso próprio, por exemplo, e não fazê-lo no prazo estipulado de 180 dias (art.47, III).

  • Os contratos de locação residencial dividem-se em dois grandes grupos: locações acima de 30 meses ou abaixo (arts.46 e 47). Acima de 30 meses: findo o prazo, prorroga-se automaticamente e para retomar o imóvel basta denúncia com antecedência de 30 dias. 

Abaixo de 30 meses, findo o prazo, prorroga-se automaticamente, porém a retomada se dá apenas em hipóteses específicas (art. 47, incisos). Vide abaixo:

Art. 47. Quando ajustada verbalmente ou por escrito e como prazo inferior a trinta meses, findo o prazo estabelecido, a locação prorroga – se automaticamente, por prazo indeterminado, somente podendo ser retomado o imóvel:
I – Nos casos do art. 9º;
II – em decorrência de extinção do contrato de trabalho, se a ocupação do imóvel pelo locatário relacionada com o seu emprego; 
III – se for pedido para uso próprio, de seu cônjuge ou companheiro, ou para uso residencial de ascendente ou descendente que não disponha, assim como seu cônjuge ou companheiro, de imóvel residencial próprio; 
IV – se for pedido para demolição e edificação licenciada ou para a realização de obras aprovadas pelo Poder Público, que aumentem a área construída, em, no mínimo, vinte por cento ou, se o imóvel for destinado a exploração de hotel ou pensão, em cinqüenta por cento; 
V – se a vigência ininterrupta da locação ultrapassar cinco anos.”

  • Na locação para temporada, o prazo não pode ser superior a 90 dias (art.48). 

Isso porque a característica desse contrato é a o fato de ser temporário.

  • Atenção para a prorrogação automática nos contratos de locação para temporada! 

As consequências são bem diferentes das disposições iniciais: a) não fora estipulada uma relação continuada, senão pontual; b) não se poderá mais cobrar os aluguéis antecipadamente; c) o locador só poderá denunciar após 3 anos do início da locação, salvo as hipóteses do art. 47.

  • Nos contratos de locação não residencial há o direito de renovação por parte do locatário (art.51) – o que não ocorre nas locações residenciais. 

Desde que o contrato por escrito com prazo determinado; a locação já some 05 anos; e a atividade comercial vem sendo explorada pelo inquilino há pelo menos 03 anos no imóvel.

  • Conceito de locação não residencial: “Considera – se locação não residencial quando o locatário for pessoa jurídica e o imóvel, destinar – se ao uso de seus titulares, diretores, sócios, gerentes, executivos ou empregados.” (art.55).

Informalmente, fala-se em locação comercial, mas a lei utiliza-se da expressão “locação não residencial”.

  • Os contratos por prazo indeterminado podem ser denunciados pelo locador com 30 dias de antecedência (art. 57). 

Quando há prazo determinado, cessa com o fim da vigência, sem necessidade de aviso. Se mantida a relação, prorroga-se de forma indeterminada (art. 56).

Direitos e obrigações da lei do inquilinato

A lei define de maneira esparsa os direitos do locatário, os quais passam a ser reproduzidos a seguir:

  • Permanecer no imóvel durante o prazo estipulado no contrato, ainda que o locador não mais deseje alugar, a menos que ocorram as hipóteses do art. 9º. 
  • Denunciar o contrato com antecedência de 30 dias.
  • Eventualmente, ser indenizado o sublocatário, pelo sublocador, quando rescindido o contrato principal de locação. 
  • Ter mantido o valor da sublocação aquém do valor da locação.
  • Exercer o direito de preferência, no caso de alienação do imóvel locado, no prazo de 30 dias.
  • Exercer, o sublocatário, o direito de preferência, caso a sublocação seja total (em detrimento do sublocador).
  • Receber indenização (e, eventualmente, o direito de retenção) pelas benfeitorias necessárias e pelas úteis autorizadas.

No que concerne às obrigações, tanto do locador quanto do locatário, a lei compilou nos artigos 22 e 23, respectivamente, os quais serão reproduzidos na íntegra.

Obrigações do locador, que é aquele que coloca o imóvel à disposição para locação.

Art. 22. O locador é obrigado a:
I – entregar ao locatário o imóvel alugado em estado de servir ao uso a que se destina;
II – garantir, durante o tempo da locação, o uso pacífico do imóvel locado;
III – manter, durante a locação, a forma e o destino do imóvel;
IV – responder pelos vícios ou defeitos anteriores à locação;
V – fornecer ao locatário, caso este solicite, descrição minuciosa do estado do imóvel, quando de sua entrega, com expressa referência aos eventuais defeitos existentes;
VI – fornecer ao locatário recibo discriminado das importâncias por este pagas, vedada a quitação genérica;
VII – pagar as taxas de administração imobiliária, se houver, e de intermediações, nestas compreendidas as despesas necessárias à aferição da idoneidade do pretendente ou de seu fiador;
VIII – pagar os impostos e taxas, e ainda o prêmio de seguro complementar contra fogo, que incidam ou venham a incidir sobre o imóvel, salvo disposição expressa em contrário no contrato;
IX – exibir ao locatário, quando solicitado, os comprovantes relativos às parcelas que estejam sendo exigidas;
X – pagar as despesas extraordinárias de condomínio.
Parágrafo único. Por despesas extraordinárias de condomínio se entendem aquelas que não se refiram aos gastos rotineiros de manutenção do edifício, especialmente:
a) obras de reformas ou acréscimos que interessem à estrutura integral do imóvel;
b) pintura das fachadas, empenas, poços de aeração e iluminação, bem como das esquadrias externas;
c) obras destinadas a repor as condições de habitabilidade do edifício;
d) indenizações trabalhistas e previdenciárias pela dispensa de empregados, ocorridas em data anterior ao início da locação;
e) instalação de equipamento de segurança e de incêndio, de telefonia, de intercomunicação, de esporte e de lazer;
f) despesas de decoração e paisagismo nas partes de uso comum;
g) constituição de fundo de reserva.”

Obrigações do locatário, que é aquele que usa o imóvel disponibilizado, mediante contraprestação.

Art. 23. O locatário é obrigado a:
I – pagar pontualmente o aluguel e os encargos da locação, legal ou contratualmente exigíveis, no prazo estipulado ou, em sua falta, até o sexto dia útil do mês seguinte ao vencido, no imóvel locado, quando outro local não tiver sido indicado no contrato;
II – servir – se do imóvel para o uso convencionado ou presumido, compatível com a natureza deste e com o fim a que se destina, devendo tratá – lo com o mesmo cuidado como se fosse seu;
III – restituir o imóvel, finda a locação, no estado em que o recebeu, salvo as deteriorações decorrentes do seu uso normal;
IV – levar imediatamente ao conhecimento do locador o surgimento de qualquer dano ou defeito cuja reparação a este incumba, bem como as eventuais turbações de terceiros;
V – realizar a imediata reparação dos danos verificados no imóvel, ou nas suas instalações, provocadas por si, seus dependentes, familiares, visitantes ou prepostos;
VI – não modificar a forma interna ou externa do imóvel sem o consentimento prévio e por escrito do locador;
VII – entregar imediatamente ao locador os documentos de cobrança de tributos e encargos condominiais, bem como qualquer intimação, multa ou exigência de autoridade pública, ainda que dirigida a ele, locatário;
VIII – pagar as despesas de telefone e de consumo de força, luz e gás, água e esgoto;
IX – permitir a vistoria do imóvel pelo locador ou por seu mandatário, mediante combinação prévia de dia e hora, bem como admitir que seja o mesmo visitado e examinado por terceiros, na hipótese prevista no art. 27;
X – cumprir integralmente a convenção de condomínio e os regulamentos internos;
XI – pagar o prêmio do seguro de fiança;
XII – pagar as despesas ordinárias de condomínio.
§ 1º Por despesas ordinárias de condomínio se entendem as necessárias à administração respectiva, especialmente:
a) salários, encargos trabalhistas, contribuições previdenciárias e sociais dos empregados do condomínio;
b) consumo de água e esgoto, gás, luz e força das áreas de uso comum;
c) limpeza, conservação e pintura das instalações e dependências de uso comum;
d) manutenção e conservação das instalações e equipamentos hidráulicos, elétricos, mecânicos e de segurança, de uso comum;
e) manutenção e conservação das instalações e equipamentos de uso comum destinados à prática de esportes e lazer;
f) manutenção e conservação de elevadores, porteiro eletrônico e antenas coletivas;
g) pequenos reparos nas dependências e instalações elétricas e hidráulicas de uso comum;
h) rateios de saldo devedor, salvo se referentes a período anterior ao início da locação;
i) reposição do fundo de reserva, total ou parcialmente utilizado no custeio ou complementação das despesas referidas nas alíneas anteriores, salvo se referentes a período anterior ao início da locação.”

Um dos pontos mais polêmicos entre as obrigações das partes diz respeito às despesas ordinárias/extraordinária, cuja conceituação por vezes mostra-se tênue. Considerando que o tema requer mais atenção, merece ser tratado em outro texto com exclusividade. 

Quando será aplicada a lei do inquilinato? 

A lei do inquilinato, portanto, aplica-se a todos os contratos de locação de imóveis urbanos, sejam eles residenciais ou não. 

No corpo da própria legislação foram previstos procedimentos judiciais especiais, que são eles: i) ação de despejo; ii) ação de consignação de pagamento de aluguel e acessórios; iii) a ação revisional de aluguel; iv) ação renovatória de aluguel. 

Para além dessas quatro possibilidades, a referida lei orienta na confecção dos contratos de locação e na própria conduta das pessoas que ocupam os papéis de locador e locatário, ambas hipóteses em que sua aplicação se dá de forma preventiva.

Conclusão

A lei do inquilinato é específica, razoavelmente simples, voltada para os contratos de locação de imóveis urbanos e mostra-se bastante eficaz ao que se propõe, regulando o mercado e resguardando as partes com direitos e deveres previsíveis. 

Isso colabora para a confiabilidade e a dinamicidade de nossas relações. Caso tivéssemos uma lei genérica ou mesmo não tivéssemos regulação alguma, possivelmente teríamos mais conflitos e mais insegurança para contratar

Aqui não se fala em uma intervenção estatal sobre o conteúdo das relações negociais (por exemplo: a estipulação do preço, prazo e condições é ampla), mas apenas da estrutura básica, que acaba contribuindo para uma uniformização e para o desenvolvimento de um maior nível de civilidade nas contratações. 

COVID-19 e as locações de imóveis

Este texto foi escrito antes da crise do COVID-19 e publicado na Coluna de uma empresa de Tecnologia da qual somos parceiras, a Aurum.

Mas, como estamos vivendo este momento e que há muitas dúvidas acerca dos contratos de locação, acrescentamos o seguinte:

Não há legislação específica para o caso de alteração do valor dos aluguéis em decorrência da crise. Ainda assim, é de nosso conhecimento que diversos locatários estão obtendo êxito ao negociarem o descontos e até reajustes dos valores anteriormente contratados.

Importante notar que existe um projeto de lei (PL 1.179/2020) já aprovado pelo Senado Federal que proíbe a concessão de decisões liminares de despejo até o dia 30 de outubro desse ano (para pedidos após o dia 20 de março), justamente diante da situação de calamidade pública.

No mais, é também possível propor uma ação revisional de alugueis para o caso de uma nova realidade do mercado que justifique a diminuição do valor até então pago.

Nós sempre recomendamos tentar a negociação em um primeiro momento!

Se precisarem de ajuda, faça o cadastro em nossa página principal para ter acesso à plataforma aonde estamos prestando assessoria gratuita para os casos relativos ao COVID-19.

Para mais informações sobre o COVID-19: https://bottimendes.com.br/blog/

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